quinta-feira, 4 de agosto de 2011

As sacas de carvão

José Luís Rodrigues
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[Os] neo-padres encarnam perfeitamente estes propósitos do saudosismo.

Com esta expressão eram denominados os padres antigamente. Sempre vestidos de negro, deambulavam pelas ruas, quais sacas de carvão, tipo combustível para o escárnio e o maldizer da sociedade em geral. Mas, era o tempo do chamado clericalismo extremo e do anticleriscalismo desmedido. Os tempos são outros, felizmente, o Concílio Vaticano II veio refrescar toda a Igreja e a sociedade cresceu em todos os aspectos. Agora, parece aparecer em toda a Igreja uma onda de clericalismo vazio, patético até. Uns saudosistas que se vestem de negro à maneira de antigamente, como se tal imagem produzisse mais e melhores frutos. Estes saudosistas não estão só entre os clérigos, também muito boa gente, os féis leigos, nutre saudades desses tempos dos «sacas de carvão». As provocações patéticas que vamos sentindo aqui e ali são sintomáticas. Mais se nota que esta simpatia anacrónica parece estar bem vincada pelos neo-padres, que encarnam perfeitamente estes propósitos do saudosismo que acompanha a nossa sociedade atulhada na crise. Como podem estes «meninos» vestidos de negro pretenderem evangelizar o mundo e cativar os jovens do nosso tempo nada votados a indumentárias formalistas, mas a formas de vestir quanto mais exuberantes melhor? - Porém, menos alguns jovens, ditos, «góticos» que têm uma predilecção pelo negro, mas são pequenos grupos ou tendências de modas muito peculiares entre a camada juvenil. A propensão para o negro dos sacerdotes novatos revela algo muito mais profundo e muito mais sério do que aquilo que se possa imaginar. Também não chega apresentar rótulos para classificar estas atitudes. Porém, não ficaremos longe de observar que tudo isto está cheio de anacronismo e reveste-se do pensamento clericalista que domina alguma Igreja europeia, cada vez mais divorciada do mundo e das pessoas do nosso tempo. Não nos damos conta de que há uma certa debandada da Igreja e resta o carreirismo e o vazio. Sim, porque por detrás da maré negra não fica muito. O sumo espiritual reduz-se a uma religiosidade superficial e piegas, a intelectualidade é de uma pobreza atroz e a consciência do diálogo com a cultura e o mundo de hoje é zero. Esta igreja não pensa, não está aberta às expectativas dos homens e mulheres deste tempo. A pobreza brada aos céus. Onde está a Igreja de grandes figuras que marcaram a história e que estavam sempre na primeira linha da cultura? - A nossa Diocese, a este nível, tem um património fabuloso. Hoje, uma grande parte da Igreja consome-se no acessório e gasta-se na tralha eclesiástica que não leva a sítio nenhum. E sem pensar que esta tralha requer somas avultadas em dinheiro. O ridículo mata. As atitudes anacrónicas são ridículas, numa sociedade cada vez mais anticlerical e adversa a tudo o que seja formalismo extemporâneo e anacrónico. A realidade há-de desmentir tudo isto e o embate será tão forte que antevejo uma dor muito grande para todos os conservadorismos emergentes. É preciso aceitar o sacerdócio ministerial como participação na missão de Cristo. Pois, pelo sacramento do Baptismo, todos os fiéis participam no sacerdócio de Cristo. O sacerdócio ministerial só pode ser uma intensificação do sacerdócio comum a todos. Deixemo-nos de falsas questões, porque quem coloca falsas questões só pode receber falsas respostas. Que dirá o teólogo Drewermann, sobre o neoconservadorismo? - Sei apenas que Léon Bloy proclamou: «Como não amam ninguém, crêem eles que amam a Deus». E mais ainda, «ninguém se aproxima de Deus afastando-se dos homens... E ninguém se dá reservando-se para Deus. Porque motivo nos teria Ele então oferecido o amor?».